Todos nós sabemos da origem multifatorial do bruxismo, contudo poucos são os fatores psicossociais e individuais considerados na abordagem clínica. Além do desgaste dentário, outras características também devem ser questionadas na consulta clínica quando buscamos o diagnóstico para o bruxismo, como relato de dor orofacial, dor temporomandibular ou mesmo dor de cabeça.
Porém, diante de alguma característica clínica do bruxismo infantil, o cirurgião dentista deve ficar muito atento a um ponto importante que deve ser investigado: a qualidade do sono. Essa por sua vez é um dos fatores que podem estar associados ao bruxismo infantil, podendo refletir diretamente no desempenho escolar, obesidade, irritabilidade, entre outros, influenciando a qualidade de vida e desenvolvimento infantil.
O que vamos abordar:
- Quais são os fatores?
- Mas como estes fatores podem interferir?
- E afinal, qual a relevância clínica desse achado?
Quais são os fatores entre o estresse familiar e o bruxismo infantil?
Um grupo de pesquisadores atentos a esta multifatorialidade, conduziu um estudo caso-controle com 320 crianças com o objetivo de investigar a associação entre o provável bruxismo do sono (relato dos pais + desgaste dentário/desconforto muscular) e características sociodemográficas, estresse materno, funcionamento familiar, estresse infantil e histórico de hábitos orais em crianças de 8 a 10 anos.
O principal achado foi que entre as crianças que apresentam estresse, cerca de 67% apresentaram bruxismo do sono, sendo que crianças que apresentam estresse ou hábito de roer unha aumentam as chances de apresentar bruxismo em pouco mais de 2 vezes. Portanto, o mau funcionamento familiar e o estresse infantil podem desempenhar um papel importante na adoção de hábitos orais prejudiciais pelas crianças.
O papel da família no estresse da criança diz respeito à coesão familiar, que é a capacidade de uma família permanecer unida ao enfrentar adversidades na vida diária e da adaptabilidade, que é a capacidade dos membros de uma família de mudar as regras de funcionamento da mesma, quando necessário.
Mas como estes fatores podem interferir entre o estresse familiar e o bruxismo infantil?
Os hábitos orais são mecanismos de liberação de tensão, pressão, insegurança, ansiedade… É possível que algumas crianças substituam hábitos orais, como chupeta e sucção do dedo/polegar, por outros hábitos, como roer unhas e morder objetos. O bruxismo então, pode ser uma maneira involuntária, de alívio destas tensões durante o sono.
E afinal, qual a relevância clínica desse achado entre o estresse familiar e o bruxismo infantil?
Diante dos achados, a associação entre hábitos e o bruxismo abre um leque muito maior de entendimento da origem destas alterações. O profissional deve direcionar sua atenção para o diagnóstico do bruxismo, de forma multidisciplinar e entender o papel do estresse infantil, e o peso que o funcionamento familiar (coesão e adaptabilidade) e o estresse da mãe podem influenciar neste contexto.
Uma dica? Trabalhe em equipe e encaminhe quando necessário. Precisamos ficar atento à saúde do nosso paciente como um todo, pois somente assim você terá entendimento sobre os fatores causais e o melhor tratamento para o seu paciente!
Por Ângela Giacomin.
Drumond CL et al. Do family functioning and mothers’ and children’s stress increase the odds of probable sleep bruxism among schoolchildren? A case control study. Clin Oral Investig. Jul, 2019. doi: 10.1007/s00784-019-02997-8.